segunda-feira, 9 de abril de 2012

Brincadeiras de índio

Parque Indígena do Xingu, 08 de abril de 2012

Nessa semana que passou, brinquei muito. Todas elasforam brincadeiras de índios, menino e homem.

Na terça-feira, como de costume, depois dos afazeres da manhã (tomar café com tapioca, terminar de preparar aulas, limpar o terreno, cuidar da horta, e outras atividades diárias), fui tomar banho no rio, antes da hora do almoço. Chegando no rio, vi a criançada brincando. Prontamente, me juntei a eles, e fui brincar do mesmo jeito deles!

As brincadeiras são muito simples. Nadar, mergulhar, atravessar o rio nadando, subir nas árvores, subir nas árvores na beira do rio e pular na água, subir no barranco e pular dentro do rio, jogar água nos outros, e vários outras atividades que estejam ligadas ao brincar na água. Até ai, tudo bem, nenhuma dessas brincadeiras é novidade pra mim. Exceto subir nas árvores, que não aguentariam meu peso... fiz todas as outras com eles (o mais legal é que, os pequenos ficaram me perguntando se eu teria coragem de subir no barranco e pular no rio - acho que eles pensaram que eu num sabia subir no barranco, e nem teria coragem de pular). Claro que subi e pulei (o ponto mais alto devia ter uns 5 metros). Apesar das brincadeiras não serem novidades, o que está envolvido nelas, é novidades sim (pra mim).

Estas brincadeiras são corriqueiras, quase diárias (da mesma forma que pegar anzol e linha e ir pra beira do rio pegar peixinho). São durante estas brincadeiras que os meninos fortalecem as relações, além de aprenderem algumas coisas que são importantes pra sua vida (o não aprender também é um aprendizado, como é o caso de não aprender a ter medo de nadar, não aprender a ter medo de pular do barranco, não aprender a ter medo de atravessar o rio nadando - tudo isso, ele pode precisar quando for adulto, e se aprender a ter medo, pode ser que ele não consiga fazer). Além disso, há o aprendizado que é passado, ou que é observado, como não pular do barranco logo depois que um outro pular, ou quando um outro estiver lá embaixo, já que isso pode ser muito perigoso.

Uma outra coisa que é muito interessante, é que todos eles fazem tudo isso, sem roupa. A nudez para um indígena, é muito diferente que para mim (na verdade, eu num sou um bom exemplo, já que num é preciso muita coisa pra eu ficar nu...). Refazendo a frase: a nudez para um indígena, é muito diferente para um cidadão urbano "comum", criado com nossos conceitos de pudores, pecados, pureza, etc. A nudez, é simplesmente uma forma de apresentação diferente (pelo menos, é assim que consigo entender), e isso não significa nada como algo imoral, despudorado, desrespeitoso, ou qualquer outro conceito ligado a uma falsa moral. 
Compartilhar a nudez, é um momento de não aprender a ter vergonha, já que, todos eles precisarão ficar sem roupa na frente de todos em certos momentos, principalmente em uma aldeia (mais uma vez, a idéia de nudez é diferente).

Enfim, é desde criança, que começa a se formar um adulto. Se o pequeno índio não passar por estas etapas, no momento certo, ele não conseguirá se transformar em adulto na hora que precisar, tampouco conseguirá executar as atividades que ele precisa nessa outra fase de sua vida.
Essa realidade que estou vivendo, difere em muito, do que vi ano passado, quando vivi em Boa Vista-RR, que relatei no post 12 Anos.

Agora, é hora de falar das brincadeiras de adultos, que fiz na quarta, quinta e sexta... e foi difícil!
Como já mencionei antes, estou fazendo uma horta. Aqui, é assim: se tu quer fazer alguma coisa, vai e faz! Num vai ter ninguém fazendo as coisas pra tu não - no máximo, ajudando.
Isso quer dizer que, eu tenho que fazer a horta, incluindo todo o cercado dela, pra evitar que as galinhas entrem pra comer as folhas.

Na hora de buscar madeira pra fazer o cercado, um senhor (Matan matan ou Tucuman) me ajudou a ir na mata, pegar madeira e trazer pra perto de casa (isso, na quarta-feira). O problema é que, cada feixe de madeira deveria pesar uns 50 kg, e a mata fica a quase 1 km de casa. Em suma, carreguei 3 carradas de madeira, de 50 quilos cada, por case 1000 metros. Pode num parecer muito, mas, depois de tanto chão, cada carga tava pesando muito. Pra mim, que num tô acostumado a fazer isso, é osso. Além do peso, o jeito de carregar o material é meio troncho. 
Vendo o Tucuman fazer, parece simples (e ele tem 57 anos, 1,65 de altura, e deve pesar uns 70 quilos), mas num é não. A aparente simplicidade vem de um aprendizado desde criança, seguido de muita prática.

O bom é que, depois de tentar fazer, de um jeito completamente errado, ele me ensinou a fazer o certo (ele falava assim: Geoge, índio faz assim ó...). Nada como ter a seu alcance, a experiência de quem fez muitas e muitas vezes.
Além de aprender a cortar as madeiras, tirar casca pra amarrar os feixes, usar facão e machado, e carregar tudo, levando as ferramentas juntas (tudo de um modo seguro), levantar tudo do chão e parar pra descasar, foram parte do aprendizado!

Na quinta, foi hora de capinar o terreno mais uma vez, pra tirar o capim persistente e furar os buracos pra colocar as estacas de madeira. Ai foi a hora de fazer calos nas mão!
Mais uma vez, pra quem tá acostumado a trabalhar, quase que exclusivamente, com o computador, furador e enxada são ferramentas muito desgastante (faz uns anos que num usava essas ferramentas, desdes os tempos de faculdade, nas famosas Ocupações Verdes). Com o tempo, tendo que fazer tudo que preciso, os calos já estarão secos, e ficará cada vez mais fácil usar as ferramentas (agora, no período final de implantação da minha horta, tá ficando mais fácil e menos doloroso - mas as mãos estão engrossando).

Na sexta, foi hora de carregar cerca de arame e cercar. Depois do que fiz nos dias anteriores, isso foi o mais fácil!

A mais saborosa de todas as brincadeiras, foi a de hoje, domingo, pois fui aprender a pescar.
Pra terem uma idéia, a fartura de peixe é tão grande, que mesmo um pescador iniciante que sou, em 2 horas de pescaria, peguei 3 peixes (02 Cachorras e 01 Bicuda - somados, davam uns 17kg de peixe). A Bicuda, virou parte do jantar de 07 pessoas, com arroz e tapioca... muito bom.

Pois é, essas foram as brincadeiras da semana. Posso dizer que têm sido muito divertido, essas brincadeiras de aprender a viver essa nova vida, sempre brincando!

Saudações Xinguanas

2 comentários:

Anônimo disse...

É, vivendo e aprendendo com os indiozinhos e com os indiozões...
E que peixões, hein? Consegue farinha com coco pra "ornar"?
Bjsss
Vick

George Leandro disse...

ornar... esse povo parece que é Mineiro hehehe

Aqui num tem muita farinha não, o lance mesmo é beiju (tapioca). Até tem coqueiro, mas os frutos não chegam a ficar maduros, são consumidos verdes mesmo (somente a água).
Peixe com beiju já vale, e muito!
Bjs